quarta-feira, 12 de junho de 2013

Fogo

Eu vejo amores que já nascem moribundos, laços que se soltam quanto é executada a última canção e paixões que duram até que a brasa do cigarro alcance o filtro. Eu vejo reflexos de uma geração perdida que, em relação ao amor, muito se fala sobre o substantivo, mas pouco se faz pelo verbo. Nas garrafas, os líquidos estão pela metade. Coincidência, meu coração também.

No pulso, ouro; no abraço, couro; cigarro nas mãos. As luzes estão piscando, os olhos procurando, a boca esperando. Aqui não há vítimas unilaterais, nem vilões: todos fazem os dois papeis. A caça e o caçador vivem em harmonia. Aprenderam: por aqui, não há quem ganhe com imposição; ganha-se negociando.
A cabeça está confusa, não pela baunilha, mas por não saber o que quer. Em meio a dezenas de corações, de histórias e motivos diferentes que os levaram ali, você só tem o seu. Sorrisos, novamente, escondem a verdade.

Levanta-se com o copo, tira do bolso o isqueiro e o cigarro, o som da banda distancia, enfraquece. Até que é quebrado por uma pergunta:
_ Você tem isqueiro?
Na verdade, muitas vezes o isqueiro é apenas o álibi de uma armadilha que a presa, dessa vez caçador, faz à outra. Seria mais fácil se, ao invés de pedirmos o isqueiro, pedíssemos um pouco de amor e fossemos atendidos. Mas não. A presa à sua frente, vulnerável. Ame-a, complete-se, complete-a…
_ Tenho.

Tantas coisas a serem ditas, gestos a serem feitos, tantos sorrisos. Apenas emprestou. A presa acendeu sua arma autodestrutiva e se foi. Talvez ela só quisesse o isqueiro, talvez não. Quando irás descobrir? Quando aprender a negociar o fogo. 

Alguém disposto a acender meu cigarro?