Revolvendo

A lua resplandecia no céu negro, fazendo sua luz queimar a minha pele.
A neve que cobria os meus pés deixava o ar gélido, sufocando os meus pulmões.
A suave neblina ofuscava a minha visão.
O silêncio era ensurdecedor.
Perdido no vazio, eu sentia dor, fome e frio.
Quando a morte pareceu inevitável, um feixe de luz prateado surgiu do céu.
Um anjo de longos cabelos negros, olhos flamejantes e garras de aço surgiu em minha frente.
Sua voz era doce ...
"Seu pecado é hediondo Abel, mas a clemência do meu Senhor é maior.
Ajoelhe-se e se arrependa de todas as atrocidades que cometeu."
Sua voz era doce e suas palavras rasgaram a minha alma como uma lâmina.
Eu senti o peso do mundo cair sobre os meus ombros. Uma força devastadora me forçando a submeter-me.
"A mão do meu Senhor pesa sobre ti Abel.
Quando seu joelho tocar o chão, sua alma será levada ao sofrimento eterno.
Arrependa-se e será perdoado."
Meu corpo ficava cada vez mais pesado. Meus pensamentos eram desordenados.
E durante um milésimo de segundo, eu a vi. Talvez apenas uma alucinação causada por eu estar com fome e com frio. Mas ainda assim, eu a vi.
Sorrindo.
E seu sorriso era pra mim, como o sangue é para um vampiro.
Seu sorriso era pra mim, como o santo é para um fiel.
E neste instante, clamei:
"Escute-me anjo, e grave as minhas palavras.
Eu, Abel, lhe digo.
Se o fato de amar a si próprio a ponto de considerar a si mesmo um Deus for pecado, eu sou um herege.
Eu sou extremamente narcisista.
Sacrifiquei meu espírito para realizar os meus sonhos.
CONSIDERE-ME CULPADO.
Vaguei pelo inferno e de lá eu trouxe o fogo que alimenta a minha esperança.
CONSIDERE-ME CULPADO.
Para superar obstáculos eu realizei verdadeiros milagres.
CONSIDERE-ME CULPADO.
Mas em verdade eu lhe digo Uriel.
Ainda que morto e mutilado pela eternidade, meus pensamentos ecoarão pelo mundo durante eras ..."
O peso em meus ombros havia cessado.
Uriel olhou em meus olhos durante algum tempo.
Seu olhar era melancólico.
O mesmo feixe de luz surgiu do céu e o levou.
A luz da lua não queimava mais a minha pele. O ar gélido não sufocava mais os meus pulmões e eu conseguia ver tudo nitidamente.
E pela última vez, eu olhei para o céu e sorri.

Por esta razão eu tenho um blog. Tirem seu próprio epílogo.


Porque ou pra que ter um blog?
Digam-me vocês.

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